Entidades da sociedade civil apresentaram no II Fórum da Internet uma carta aberta em que questionam as políticas do Governo Dilma Rousseff para comunicação e cultura digital. Leia abaixo a íntegra.

 

Quadro crítico nas políticas de comunicação e cultura digital é resultado das opções do Governo Federal

 

18 meses após a posse de Dilma Rousseff, o Governo Federal demonstra que já fez as opções estratégicas na construção das políticas de comunicação e cultura digital. Lamentavelmente, essas opções não estão pautadas pela perspectiva da garantia de direitos. Isso fica claro quando vemos que programas estratégicos, como os telecentros e os pontos de cultura, correm o risco de serem descontinuados. Também o Programa Nacional de Banda Larga tem sido construído a partir de uma aliança com as grandes empresas do setor, com graves prejuízos ao interesse público. Essas opções, aliás, têm sido a marca principal das políticas nessa área: privilegia-se a lógica de mercado e de ampliação do consumo, sem estabelecer uma perspectiva de garantia de direitos.

Da mesma forma, o Brasil segue com um extraordinário atraso em relação à legislação sobre o setor. A iniciativa de construção de um novo marco regulatório das comunicações tem sido seguidamente adiada. O Código Brasileiro de Telecomunicações completa 50 anos em agosto, e está longe de dialogar com a realidade das mudanças tecnológicas, da convergência de mídias e, sobretudo, da necessidade de garantia da liberdade de expressão do conjunto da população brasileira.

Mais preocupante é o cenário das telecomunicações e inclusão digital. No PNBL, não se trata o acesso à internet em banda larga como direito do cidadão, e tem sido frequentes declarações de membros do governo que reforçam uma lógica de tratamento diferenciado de cidadãos brasileiros em função da região em que habitam. Moradores da região Norte e das áreas rurais são, muitas vezes, convidados a se conformar a uma situação de acesso mais caro e de pior qualidade, o que é inadmissível.

Esse quadro confirma que a massificação proposta pelo Governo não dá resposta à necessidade de tratamento isonômico entre os consumidores de alta e baixa renda, e entre as cinco regiões do Brasil. Reivindicamos a universalização do serviço, que é a garantia legal de direitos iguais para todos e todas.

Por sua vez, o debate sobre o regime de prestação de serviços da banda larga e sobre o fim das concessões de telefonia fixa tem sido feito sem referência a um projeto estratégico de telecomunicações, e há o risco de decisões do Governo Federal implicarem numa doação de mais de R$ 60 bilhões em bens públicos para as atuais concessionárias de telefonia, colocando em risco a estrutura pública de telecomunicações.

Os problemas que persistem sobre as políticas públicas de banda larga também se dão sobre o programa de cidades digitais. As contribuições da sociedade civil feitas à consulta pública foram desconsideradas, e a gestão do programa poderá ser entregue às empresas de telecomunicações para exploração comercial. Também as lan houses, alvo de promessas de campanha, seguem sem qualquer ação ou sequer diálogo com o Governo Federal.

 

Inclusão digital sob risco

A última década assistiu a uma organização da sociedade civil em prol da inclusão digital, iniciando um movimento que reuniu todos os setores sociais, todas as esferas de governo, iniciativa privada, fundações, universidades e terceiro setor.

Em eventos organizados conjuntamente pelo Governo Federal e pela sociedade civil, foi constante a reivindicação de uma centralização das iniciativas de inclusão digital em torno de uma secretaria dedicada ao tema. Ressaltava-se também a ausência de uma formação continuada para os agentes de inclusão digital que atuam nos espaços comunitários dos telecentros de todo Brasil.

Com a compreensão da importância desse movimento e dessas políticas públicas, a Presidência da República possibilitou, em 2010, o nascimento do programa Telecentros.BR e em 2011, a Secretaria de Inclusão Digital em que foi abrigado o Programa.

Após menos de dois anos de funcionamento estamos sendo surpreendidos com a morosidade da entrega dos equipamentos e conexão a banda larga e com as atuais medidas do Programa Telecentros.BR, com a interrupção de entrada de novos monitores. É inadmissível que tomadas de decisão desta importância sejam feitas de forma unilateral desrespeitando convênios assinados entre a Secretaria de Inclusão Digital e as instituições conveniadas, além do rompimento de um processo histórico de discussões e construções democráticas pelo direito ao acesso à informação.

Em meio a um cenário de fragmentação que dificulta o tratamento coerente e estratégico desses temas, a boa notícia vem pelo avanço do Marco Civil da Internet. O projeto de lei gestado pelo Ministério da Justiça em parceria com a sociedade civil reúne um conjunto de questões fundamentais para a garantia da liberdade na rede, e aborda o tema sob a lógica de garantia de direitos civis dos usuários. É fundamental que sua tramitação se dê de forma célere, garantido o respeito a processos democráticos.

 

Diálogo rompido pelo Governo

O Brasil tem em seu quadro institucional exemplos positivos de como avançar. A experiência multisetorial do Comitê Gestor da Internet e a consolidação do Fórum da Internet, depois de sua segunda edição, são exemplos concretos disso.

Lamentavelmente, a opção do governo tem sido pela restrição dos diálogos com a sociedade civil e movimentos sociais, privilegiando a interlocução com o setor privado. Com 18 meses de governo, esta parece ser uma escolha consciente do Governo Dilma Rousseff, materializada em ações dos Ministérios das Comunicações e da Cultura. A sociedade civil que atua nesses setores seguirá lutando para retomar os espaços de diálogo e transformar essa situação, na defesa da comunicação e da cultura como direitos humanos fundamentais.

 

Olinda, 5 de julho de 2012

 

AbcidAssociação Brasileiro de Centros de Inclusão Digital

ArpubAssociação das Rádios Públicas do Brasil

Artigo 19

Associação Movimento Comunicação Rádio Comunitária CPA FM

Associação Software Livre

CDICampinasComitê para Democratização da Informática

Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé

Centro de Tecnologia e Sociedade da Fundação Getúlio Vargas (CTS/FGV)

CFPConselho Federal de Psicologia

Clube de Engenharia

Coletivo Digital

Coletivo PuraquéSantatém/PA

CUTCentral Única dos Trabalhadores

CUT-RJ

Fenadados

Fitert – Federação dos Radialistas

FNDCFórum Nacional pela Democratização da Comunicação

FrenavatecFrente Nacional pela Valorização das TVs do Campo Público

Fora do Eixo

Geledés – Instituto da Mulher Negra

IdecInstituto Brasileiro de Defesa do Consumidor

InfocentroMaracanãSantarém/PA

Instituto Bem Estar BrasilRJ

Instituto Patrícia Galvão-Mídia e Direitos

Instituto Telecom

IntervozesColetivo Brasil de Comunicação Social

Mega Não

Movimento CineclubistaAltamira/PA

Partido Pirata do Brasil

Projeto Saúde e Alegria

ProtesteAssociação de Consumidores

Sindados-BA

SindipetroRJ

SinpdAP

Três Brasis ComunicaçãoRecife/PE

ULEPICC-Br